@ tainah negreiros

sábado, 15 de outubro de 2022

Petite Solange (Axelle Ropert, 2021)



 "Conheço o fundo doloroso das coisas, não conheço mais nada." (João César Monteiro)

"Tanta coisa que então eu não sabia. Nunca tinham me falado, por exemplo, deste sol duro das três horas. Também não me tinham avisado sobre este ritmo tão seco de viver, desta martelada de poeira. Que doeria, tinham-me vagamente avisado." (Clarice Lispector)

Olhar Solange existir só perde em potência pra quando vemos o que Solange vê. Eu ainda estou tentando entender o que exatamente está contido no ponto de vista de Solange criado por Axelle Ropert, principalmente quando ela olha para família, quando vemos mãe, pai e irmão no mesmo plano através dos olhos dela. É o olhar doloroso do amor familiar e do lamento de alguma coisa qualquer que está se perdendo, que está sempre se perdendo no mundo do amor, e que Solange vivencia intimamente de maneira dolorosa e única.

Na primeira calmaria depois do início do processo de separação da mãe e pai de Solange, e também dela e do irmão Romain, ela conta para aquele que é seu interesse amoroso sobre uma viagem que a família toda vai fazer para a Sicília. O rapaz a escuta e pergunta "Você é apegada a sua família né?" É, ela é, pensamos junto com Solange e recapitulamos toda a jornada afetiva que o filme vem acompanhando e que ele vive inteiramente, profundamente e dolorosamente. A pergunta do rapaz que mal a conhece sintetiza isso mas também o modo como Solange põe as flores no jarro em total não aceitação do fim daquela casa. Ela vai, volta e conclui: "Ninguém tinha me dito o quanto poderia ser difícil viver." E é. E é.