@ tainah negreiros

quarta-feira, 16 de outubro de 2024

o ipê

se eu ficar a noite acordada de frente para a árvore eu vejo essa flor de ipê abrir?
ontem quase nada
pela manhã alguns bulbos
agora à noite, muitos
prontos para abrirem quando não vemos


maravilhosa discrição


se aproveitam da distração humana
do correr do dia
e da calma da noite, em são raimundo
para se abrirem


quando a saudade do meu pai é tamanha
e estou aqui
seguro os galhos secos do ipê na frente da casa
como se segurasse os braços dele
até sentir a presença misteriosa 
os jeitos dele ser agora
no mundo
de existir agora
no mundo

penso nele todo dia
a música popular brasileira é toda ele
e esse ipê
que teima em florescer nessa secura
é a vida teimando em ser

terça-feira, 2 de janeiro de 2024

 Tava vendo o filme do Victor Erice e a gata me chama na porta. Não era comida que ela queria, era me mostrar algo. Foi me conduzindo pelo jardim da casa enquanto olhava alguma coisa invisível que quero acreditar que era meu pai. Com meus próprios braços me abracei sem que percebesse, procurando ele e encontrando.

sábado, 9 de dezembro de 2023

a árvore

 Hoje quis tanto pode tocar meu pai que segurei com as mãos dois galhos secos de ipê como se fossem ele. Ele amava ver os ipês florescerem e mudarem a paisagem. 

sexta-feira, 1 de dezembro de 2023

o radialista

queria poder alcançar meu pai em uma frequência
como quem sintoniza uma rádio

terça-feira, 3 de outubro de 2023

easy
my man and me
we could rest and remain here, easily
we are tested and pained by
what's beyond our bed

we're blessed and sustained by
what is not said

no one knows what is coming
or who will harvest what we have sown
or how I've been dulling and dumbing
in the service of the heart alone

or how I am worn to the bone by the river
and in the river, made of light
I'm your little life-giver
I will give my life


sexta-feira, 22 de setembro de 2023

La Belle Noiseuse (Jacques Rivette, 1991)

 


Os imensos filmes alteram completamente a cinética e a percepção de quem os vê logo em seguida. Depois de ver "La Belle Noiseuse" tive vontade de comer algo gostoso e belo ao mesmo tempo. No mesmo dia em que vi "La Belle Noiseuse" eu comi figo fresco pela primeira vez e fiz uma torta de figo adocicada e salgada. Fiz bem devagar como que afetada pelo estado de integridade do gesto, do ímpeto e da construção que Jacques Rivette opera em parceria com Jane Birkin, Emmanuelle Béart, Michel Piccoli, William Lubtchansky, Emmanuel de Chauvigny, Christine Laurent, Pascal Bonitzer e Igor Stravinski. Com esse filme há sempre a sensação de enormidade das capacidades do cinema. O que o tempo e maneira do filme faz com o gesto do artista? O que o tempo e a construção fazem com a percepção que temos do corpo de Marianne e de Marianne além do corpo? E em quem ela, para além do corpo pintado visto, contorcido e retratado, vai se transformar menos e mais encoberta fisicamente e metaforicamente? Como através do que constrói Rivette conseguimos intuir a força, vulnerabilidade e crueldade de Liz e tudo que está implicado no encontro e na possível perda de Fenhofer? Como, em meio a centralidade do gesto e da criação de Fenhofer, Rivette sublinha uma conexão e os olhares das mulheres sempre retratadas, as trocas misteriosas entre elas. Que tipo de coisas elas criam? O que elas criam ali cria também para o cinema? É um assombro o que o filme descortina e não descortina jamais.

quarta-feira, 28 de junho de 2023

há um momento após desviares o olhar
em que te esqueces de onde estás

pois tens vivido, parece,
noutro lado, no silêncio do céu nocturno.
 
deixaste de estar aqui no mundo.
Estás num lugar diferente,
um lugar onde a vida humana não tem sentido.
 
não és uma criatura num corpo.
Existes como as estrelas existem,
participando na sua quietude, na sua imensidão.
 
até que volta a estar no mundo.
de noite, numa colina fria,
a desmontar o telescópio.
 
só depois percebes
que não é falsa a imagem
mas a relação.
 
vês de novo como cada coisa
fica tão longe de todas as outras.

(Telescópio, de Louise Gluck)
 

domingo, 18 de junho de 2023

Salve-se Quem Puder (A Vida), de Jean Luc Godard (1979)

 






"Salve-se Quem Puder" é uma outra forma de dizer capitalismo. "A vida", ou qualquer coisa muito muito bonita e fora da ordem no meio desse estado de coisas, vem de Godard.

sábado, 15 de outubro de 2022

Petite Solange (Axelle Ropert, 2021)



 "Conheço o fundo doloroso das coisas, não conheço mais nada." (João César Monteiro)

"Tanta coisa que então eu não sabia. Nunca tinham me falado, por exemplo, deste sol duro das três horas. Também não me tinham avisado sobre este ritmo tão seco de viver, desta martelada de poeira. Que doeria, tinham-me vagamente avisado." (Clarice Lispector)

Olhar Solange existir só perde em potência pra quando vemos o que Solange vê. Eu ainda estou tentando entender o que exatamente está contido no ponto de vista de Solange criado por Axelle Ropert, principalmente quando ela olha para família, quando vemos mãe, pai e irmão no mesmo plano através dos olhos dela. É o olhar doloroso do amor familiar e do lamento de alguma coisa qualquer que está se perdendo, que está sempre se perdendo no mundo do amor, e que Solange vivencia intimamente de maneira dolorosa e única.

Na primeira calmaria depois do início do processo de separação da mãe e pai de Solange, e também dela e do irmão Romain, ela conta para aquele que é seu interesse amoroso sobre uma viagem que a família toda vai fazer para a Sicília. O rapaz a escuta e pergunta "Você é apegada a sua família né?" É, ela é, pensamos junto com Solange e recapitulamos toda a jornada afetiva que o filme vem acompanhando e que ele vive inteiramente, profundamente e dolorosamente. A pergunta do rapaz que mal a conhece sintetiza isso mas também o modo como Solange põe as flores no jarro em total não aceitação do fim daquela casa. Ela vai, volta e conclui: "Ninguém tinha me dito o quanto poderia ser difícil viver." E é. E é.

terça-feira, 25 de janeiro de 2022

La bande des quatre (Jacques Rivette, 1989)


Tudo no filme se converte em encenação, é no teatro que ele se funda e é no teatro que ele se resolve. A professora de teatro e as alunas inventaram um mundo de mulheres em que elas circulam, em que elas são mais de uma o tempo inteiro, universo impenetrável por homens mas que eles existem através delas. Um mundo contra prisão. Algo que faz com o que "La bande des quatre" se encaminhe para uma das dedicatórias mais lindas da história do cinema, se não, a mais bela.

terça-feira, 21 de dezembro de 2021

Drive My car (Ryusuke Hamaguchi, 2021)





O que um gesto superficial (todo gesto é superficial mesmo que se transforme em outra coisa e daí nasce o teatro e depois o cinema) ou uma palavra (entonação, encadeamento com outras, gesto que a representa) diz sobre o mistério que é cada pessoa? Como vamos atuar a partir desse mistério? Como vamos transar? Como vamos dançar ou sermos incapazes de fazê-lo? Como vamos dirigir? Como vamos sobreviver? Seguindo, como recomenda Sonya, em Tio Vania. 

Dos mais bonitos filmes que já vi.

quarta-feira, 11 de agosto de 2021


 O vôo vermelho (acrílica e aquarela sobre papel 30 x 42 cm)

mais pinturas que fiz aqui: https://tainahnegreiros.myportfolio.com

terça-feira, 10 de agosto de 2021

 


É na imprecisão da comunicação de Hanne que reside a ambiguidade dos Contos de Julho, de Guillaume Brac. A angústia final dela talvez venha disso. Na confusão com as questões da ordem do coletivo, a impressão é de que Hanne deseja profundamente poder ser confusa, equívoca, indecisa, ambígua, suscetível sem que isso queira dizer imediatamente um interesse sexual, um sim, mas somente uma manifestação da sua liberdade.

terça-feira, 20 de julho de 2021


Há alguma coisa sobre família ou sobre a incompreensão da aventura de cada pessoa que esbarra no amor familiar. As aproximações e reaproximações são dolorosas, cheias de passado. De alguma maneira, manter alguma distância nos vínculos dessa natureza parecem uma forma de sobrevivência neste filme, ou um caminho para uma liberdade qualquer.

É como quando o Young-Ho, o protagonista, decide não interromper o momento pensativo e solitário da mãe. Tudo está contido naquela decisão e na rebeldia que o acomete com essa distinção.
Trata-se de uma coleção absurda de intimidade que não podemos ver mas adivinhamos pelas superfícies que Hong Sang Soo nos oferece. Da materialidade da realidade à materialidade do sonho (que também é vida vivida, é realidade, como diz Preciado) os personagens se expandem. Imenso.

domingo, 18 de julho de 2021
















 Cabeça de Flor Até a Lua (acrílica sobre papel, 20 x 30 cm)


mais pinturas que fiz aqui

segunda-feira, 12 de julho de 2021

Wheel of Fortune and Fantasy (Ryusuke Hamaguchi, 2021)

 


No tarot, a carta da Roda da Fortuna é da radical contingência, do movimento constante, a que fala de que nenhum sentimento é final. De alguma forma, é uma carta de esperança, de fé na mudança e na instabilidade. O engenho da vida está transparente no filme de Hamaguchi. Há sempre alguma coisa que um encontro pode transformar, uma graça qualquer que pode surgir quando há uma verdadeira conexão.
Para a protagonista do primeiro conto é doloroso ver essa mágica acontecer mais de uma vez e implicá-la. Mas nada que a impeça de um gesto deliberado de ruptura para seguir. Na segunda história o encontro pendula do erótico ao moral em um borramento sedutor em que um está contido no outro. Há um erotismo na dignidade. É fascinante.
E finalmente, no terceiro conto, há o aparente engano que se revela a compreensão imensa quando de fato se encontra alguém, quando se expõe o que é encontro em sua radicalidade esperançosa de ver e ser visto pela outra pessoa. Lindo lindo lindo!

segunda-feira, 21 de junho de 2021

Garoto, de Julio Bressane (2015)


A citação de Café da Manhã na Grama do Manet não é só um tableau vivant vaidoso para fazer uma citação erudita qualquer, é uma compreensão da figura humana na pintura, mais especificamente da mulher daquela pintura, do que ela irradia e de todas as palavras que ela seria capaz de dizer no meio do mato. É uma tensão moderna, uma tensão eu- natureza, eu-potência-eu-diminuto -eu-imensidão. O ponto de partida é essa vibração, é a citação pictórica e o que no filme vem ainda antes: a fala da personagem de Marjorie Estiano. A fala que tão bem representa a aventura branca que é essa de encontrar algo para além de si mesmo quando a afirmação de si é sempre o que assombra.

disponível na mostra Três décadas brasileiras pela cinefilia https://vimeo.com/channels/cinematecadomam

sábado, 19 de junho de 2021

sistema solar



um planeta se disfarça de estrela
em um céu impuro
de primavera
do hemisfério norte
o homem me chama para a janela
lá fora marte, vênus e a estrela spica
a ursa maior
e uma lua minguante generosa de luz

no sul do mundo que é o nordeste do brasil
eu via júpiter
e vênus sempre eu via, como quem olha para o espelho
são maravilhosos os planetas e seus disfarces
e o céu é das minhas festas preferidas

Etel Adnan Untitled, ca. 1960s

Etel Adnan
Untitled, ca. 1960s

domingo, 28 de março de 2021

 



O futuro amarelo (depois de Yvonne Rainer)

acrílica sobre papel 30 × 42 cm

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sábado, 4 de julho de 2020

sempre que encontro o meu amor
eu penso e digo
"ontem eu estava lá
agora eu estou aqui"
é formidável
eu não amava os aviões antes
agora eu os amo
mas é nas nuvens que eu penso mais
nos planetas, Saturno e Júpiter que hoje vejo pela janela
e nas estrelas
e no vento
que me leva como deus leva o destino das coisas e das pessoas
com força e direção
"a vida é longa e o mundo é pequeno"
como diz a canção que nos abençoou

quarta-feira, 24 de junho de 2020

The woman who ran (Hong Sang Soo, 2020)

Imagem

Um acontecimento. O maior cinema. A escolha pela sobrevivência do gato. O close no gato. O abraço visto na câmera de vigilância. A duração da pausa para tomar uma decisão. Ver um filme.

sábado, 11 de abril de 2020

Certain Women (Kelly Reichardt, 2016)


Mais uma cineasta mulher cuja pauta é a da duração. Maya Deren já assinalava como o tempo que nos é destinado e o tempo vivido por nós é diferente, culturalmente construído na diferença e também muitas vezes vinculado a determinismos naturais. É sabido modo como uma cineasta como Chantal Akerman construir sua cinematografia toda em torno de durações próprias do cotidiano e das experiências dramáticas. Sheila Heti vai na mesma direção em seu livro "Maternidade" : a paternidade biológica que para o homem pode acontecer em qualquer momento da vida é bastante diferente da limitações da maternidade biológica que exige uma relação diferente com o tempo, as decisões, com a passagem e o viver da vida, seja lá qual for a escolha a partir disso. Entre um certo essencialismo biológico e o que da biologia vira cultura, está a questão de gênero na realização cinematográfica, e essa construção diversa e própria dos tempos das mulheres. Escrevo linhas e linhas mas eu só penso na viagem da personagem de Lily Gladstone, no ímpeto, na decisão, na busca vaga mas consciente da urgência. Que urgência calma!

domingo, 29 de março de 2020

O Reino dos Gatos (Hiroyuki Morita, 2002)



"se você está procurando um lugar misterioso
com um problema difícil de resolver
existe um lugar..."

terça-feira, 10 de março de 2020

Meu amigo Totoro (Hayo Myiazaki, 1988)



É sempre com a natureza que devemos contar.

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2020

Tommaso (Abel Ferrara, 2019)

Willem Dafoe et Anna Ferrara dans "Tommaso", d'Abel Ferrara

Auto-escrutínio do homem velho que teme não ser mais necessário, do homem velho canceriano errante que deseja inventar uma casa com uma mulher 30 anos mais jovem, ser pai, ser desejante, ter paz de espírito ou quem sabe fazer as coisas certas dessa vez. É a falência do homem, de todos eles ou dessa especifidade insana ambulante que é Abel Ferrara e que Willem Dafoe de fato encarna (no sentido extremo de oferecer a carne para aquela existência) 
e com quem se mistura. Filme matéria, filme homem, filme de um tipo de homem que exerce fascínio mas também de um homem que já está na hora de passar. Alguma coisa tem que ser diferente, e Tommaso descobre isso ao falar com o homem paquistanês que gritava na rua e ameaçava acordar sua filha. Não sei dizer ao certo ainda o que acontece ali naquela instante, que tipo de coisa o personagem compreende mas, sem dúvidas, existe ali um incêndio, desses incêndios interiores, de cinema.

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2020

Retrato de Uma Jovem em Chamas (Céline Sciamma, 2019)

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Trata-se do retrato impossível de alguém que não pára de mudar, um retrato em fuga, um esforço de aura, a captura que não pode ser. Toda a primeira parte em que Marianne tem que pintar Héloise sem que ela saiba, de memória, faz com que "Retrato de uma jovem em chamas" dialogue com a dança. Não me refiro somente ao acompanhar e ao esmiuçar do gesto, mas ao vínculo da pintura e da dança como artes de memória, dadas essas condições. Existe algo a ser recomposto, recriado, algo sempre imperfeito diante do fugidio que acabou de passar, na total indissociação pré-moderna do gesto humano. Com isso posto, o filme constrói uma imobilidade somente aparente nas conversas, nas aproximações, no acompanhar, sendo que o que está apresentado é o esforço do registro de um movimento interno. Héloise deseja que seja visto e registrado por Marianne o fato de que ela muda, se movimenta, que dentro de si, acima de tudo, há o desejo do transformação. Daí só possível um retrato que ela queime, por dentro.


Se pensarmos na tradição da representação das mulheres na pintura, e no cinema, é revigorante ver um filme que se debruça por duas horas em que mulheres se vêem e que são vistas por outras mulheres, que registram esse ver, que esmiuçam essas possibilidades. Trata-se de uns dos grandes trunfos do filme de Sciamma.
Enquanto assistia, temi muitas vezes que a beleza excessiva, pelo tema plástico posto, tornasse o filme estéril, mas ele se revela muito maior na construção desse mundo de mulheres (radicalmente, não há homens personagens no filme), naquele cenário pacífico de revelações tranquilas. São cinco dias de um ideal. Ideal do amor que tem tempo para nascer, ideal da mulher que pode recusar uma nova maternidade, ideal de correr ao ar livre.

sábado, 16 de novembro de 2019

Showgirls (Paul Verhoeven, 1995)

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Rivette estava certo mas há muito mais além do que ele dizia sobre Showgirls. Aqui alguns apontamentos sobre o filme:
- Só existem conexões entre mulheres sem passado nesse filme e, mesmo sem conhecer o passado umas das outras, elas se vinculam.
- O filme existe no seu foco em Nomi por causa da primeira ruptura radical com uma figura masculina e a partir da primeira conexão radical com uma mulher. Uma coisa impressionante e bela em uma terra de homens miseráveis todos.
- Showgirls foi vendido a partir de sua "sensualidade" e "ousadia" mas é justamente sobre não haver nada sexy nele que reside sua importância. É um anti-prazer que talvez interessasse à Laura Mulvey, é uma alegria quase impossível nesse cenário, ou uma possibilidade luminosa única através das conversas que as mulheres travam e até mesmo de suas disputas que resultam em uma coisa qualquer completamente ambígua e nova, como é o caso de Nomi e Crystal.
- Toda corporealidade na esfera do sexual é nula ou agressiva. Toda corporealidade é significativa para nos mostrar a tensão presente em Nomi entre adequação e inadequação, vencendo sempre a última.
- Toda corporealidade é pulsante quando entre duas mulheres, em várias instâncias, na maioria das vezes, muito mais afetiva que sexual.
- A vulgaridade é algo que existe antes no mundo, em Las Vegas, e não do filme. A vulgaridade interessa o filme, as existências em meio a essa vulgaridade onipresente constituem o filme. O impossível belo naquele cenário só é possível em alguma persistência qualquer errante de Nomi.
- Impossível não pensar no Verhoeven viria a fazer em Elle tantos anos depois. Mais uma vez um filme sobre estupro, mais uma vez um filme em que nenhum homem sequer presta.
- Mais uma vez um filme radical, calcado nas ambivalências de suas protagonistas mas nunca ambivalente quando na potência do vínculo genuíno entre mulheres e do gigantesco cinema que nasce disso.

quinta-feira, 18 de julho de 2019

Matthijs e o oceano cor-de-rosa (acrílica sobre papel 42 x 30 cm)
Matthijs e o oceano cor de rosa (42 x 30 cm acrílica sobre papel)

https://quatroaventuras.tumblr.com/
Ainda sobre vetores, sobre história do Brasil, memória e a lei da gravidade, penso numa relação entre "Temporada" e "Café com Canela", como dois filmes que apontam pra frente, no que diz respeito ao não poder se dar o luxo de serem nostálgicos. A nostalgia no Brasil é um privilégio aristocrata que Glenda, Ary e André não podem ter e não querem. Tem memória, afeto, recuperação, sobrevivência mas a manutenção de qualquer coisa não lhes interessa (digo tudo isso pensando em Aquarius, filme que penso como vetor no sentido oposto, com disfarce de progressismo mas no fundo o verbo que se instaura nele é de manter manter e manter). É preciso ir pra frente, radicalmente modificar e é através da relação com as perdas que esses movimentos se operam, é no trauma, na persistência do chão que o seguir é mobilizado. Os dois filmes terminam em uma mesma direção. Um carro pegando no tranco e um aprender a andar de bicicleta, um reaprender, um reerguer duplicado, esperançoso e vivo. Não é um "pra frente brasil" nacionalista ditatorial, é um seguir em frente apesar da vida e apesar do Brasil.

segunda-feira, 17 de junho de 2019

Temporada, de André Novais Oliveira (2019)




O vetor de Temporada aponta pra frente, pra um futuro de esperança que é um acalento no asfixiante e sombrio Brasil 2019. Concebido por André Novais, em luminosa parceria com a atriz e dramaturga Grace Passô, a história de Juliana é de uma série de impedimentos. A perda da mãe, a não maternidade e o abandono do companheiro. Diante de todas essas negativas, essas derrubadas, de cenas várias que a gravidade age sobre seu corpo e assistimos a dificuldade dela de sair da cama, ainda assim, o filme aponta pra frente. Isso é revolucionário.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2019



Uma Canta, A Outra Não (Agnès Varda, 1977)

domingo, 13 de janeiro de 2019

Filha de Ninguém (Hong Sang Soo, 2013)


Haewon encontra sua mãe que em breve viajará para o Canadá para "fazer o que quiser." A mãe é enfática sobre o que deseja da vida. Haewon teme a sua partida mas acredita na necessidade verdadeira de expansão daquela que lhe criou. Essa primeira parte do filme Hong Sang Soo é uma preparação, é um fortalecimento. Deixar que a mãe vá é algo imenso que atravessa esse filme do cineasta sul coreano. Na segunda parte, o diretor Lee, amante da jovem, joga com seu emocional, tenta dirigí-la, controlar a relação e as medidas da exposição da história que vivem mas torna-se somente um bobo patético e covarde distante  da verdade da existência de Haewon. A primeira parte e a segunda parecem independentes mas se ligam profundamente, isso porque o fortalecimento fruto da ambivalência laço e desapego  da relação com a mãe constitui a mulher que Haweon será em suas relações, o tipo de coisa que valoriza e o que tem força para rejeitar. Ela é a filha de ninguém para ser também mãe de ninguém, de homem bebê chorão nenhum. 

domingo, 7 de outubro de 2018

it was lula's birthday
and we were talking about our love
it was lula's birthday
"the the" song playing
and you told me about happiness
and that you wanted to get old
it was lula's birthday and you told me about make me feel loved
it was lula's birthday
and we felt too young
saying mature things

it was the day before brazilian elections
the end of the world could come but
me and you
we found hope
and now I want say loud
and with an opened chest:


I want happiness for us
and for everyone

quarta-feira, 19 de setembro de 2018