@ tainah negreiros

segunda-feira, 30 de julho de 2012

Chris Marker


No momento estou entre páginas abertas sobre a notícia, descrições curtas do que ele foi, do seu cinema,  das suas contribuições, resumos de sua carreira, fiapos que fazem parte de um dia triste em que fazemos um pouco como ele, ficamos entre estilhaços, pedaços do tempo vivido que ele tanto perseguiu. Junto com tudo isso, uma página do word aberta, de um capítulo sobre a obra dele que estava escrevendo e que tinha me prometido terminar hoje.
Se pensarmos seu cinema, principalmente após "La jetée", culminando na outra obra-prima "Sans Soleil", o que temos é a perseguição de um tema que parece o da vida dele, esse de entender o que se dá sobre as pessoas, os lugares e as coisas com a passagem do tempo, o que é possível recuperar nessa passagem, e se recuperar não é possível, como reescrever, recriar?

É difícil não falar dele sem falar que, com sua ajuda, esse tema passou a ser também o da minha vida, as imagens irrecuperáveis do passado, o reencontro embassado ou poderoso com elas, o que fica, o que se perde, a convivência poderosa entre presença e ausência que constituem o trabalho da memória, tudo isso, todas essas marcas do passado no presente.
Seu cinema faz com que o dia de sua morte seja de meditação. Teria ele encontrado a imagem de alegria da sua infância? Teria o homem que viaja no tempo encontrado alguma paz na relação com suas imagens de alegria passadas? Chegar ao extremo da lembrança é encontrar a própria morte? Essas questões ele nos deixa. Hoje não é dia de dizer muito, é dia de pensar sobre ele, sobre os instantes que nos acompanham, sobre as imagens do seu cinema que nos ajudaram a pensar essas relações e sobre as outras história da vida que podemos reescrever nesse trabalho incessante que é o da memória, ela que talvez seja a nossa única chance de imortalidade.

segunda-feira, 9 de julho de 2012

tell veronika the secret of the boy you never kissed




Estou aqui tentando pensar em que momento exato de Girls aquela sensação desconcertante de identificação me pegou e não teve mais de jeito de não se envolver. Lembro do estranhamento bom quando vi Hannah tirando a roupa no encontro com Adam no primeiro episódio, do tempo dado pra esse momento, do tempo que ficamos vendo ela na sua falta de jeito, na estranheza próxima demais de um instante como esse.  Essa cena já nos alerta que as coisas vão ser boas,  fora o fato que temos uma mulher fora dos padrões físicos mostrando seu corpo, sua sexualidade, algo que enche a série de frescor e verdade.
Lembro também da delícia de conversa entre as amigas sobre a forma como Hannah deveria pedir pros pais que a ajudassem com o aluguel, construindo as diferenças de tom entre a diva Jessa e a reconhecível, e não por isso menos interessante, Marnie. Mas desconfio que o exato momento de encontro, que vai descambar em uma relação com toda a série, tenha se dado no terceiro episódio, na sequência que vai de Hannah postando e apagando frases no twitter, enquanto a música "Dancing on my own" da Robyn começa, e depois a vemos dançando desengonçada, tudo isso depois do peso de notícias sobre seu antigo relacionamento e sobre sua saúde. Até que Marnie chega, a vê, sorri e se junta a ela e as duas se abraçam ao som da música.  Essa já celebrada cena talvez tenha sido a melhor que já vi em um seriado, por essa leveza, alegria, e por conter o peso do que tínhamos visto na série até ali. Mas Girls é muito mais que esses momentos isolados, é um trabalho franco tratando de experiências de juventude. Claro, de uma certa juventude classe média, branca americana - a série, de fato, tem essa limitação, ou restrição intencional, mas mesmo assim dá conta dessa coisa batidíssima  que é crescer. Girls é sobre conseguir um trabalho, sobre não dar certo em nenhum, alugar apartamento, sobre uma cidade grande nova que parece não te querer, sobre transar, ter medo de pegar doença, procurar doença no google, rever os pais, notar complexidade neles onde não teria visto antes, voltar pra casa depois de ter uma casa nova, rever os posteres que pregou no quarto, transar com alguém e ser sentir confortável, transar com alguém que parecia legal e ser um lixo, sobre ser franco, sobre criar, sobre viver e retratar isso, sobre ser incoveniente, sobre desejar e almejar o que há de mais bizarro porque o que se tem parece sempre muito pouco, ou sobre como ser jovem às vezes é simplesmente inoportuno. 

neon lights shine bright
taxi cabs glide by
aeroplanes they fly, high up in the sky
pretty girls says "hi..."


what's the worst job you've had?
what do you read?
what's driving you mad?


Eu diria que Girls é como uma canção do Belle and Sebastian. De longe parece fofa, hype, hipster, indie, mas de perto revela uma complexidade muito maior nessa tomada de ponto de vista, que costuma sempre ser de alguém jovem, e que apesar da aparência de fofura, revela uma profundidade, delicadeza e verdade. Às vezes a série chega a ficar um pouco preguiçosa com seus demais personagens, mas com Hannah, a energia voltada por Lena Dunham é total. A personagem é escritora e está a procura de alguma coisa, de experiências genuínas para contar e elas estão todas lá, das mais bobas, às mais intensas. Às vezes isso quer dizer esquecer quem está ao redor, às vezes quer dizer retratar quem está por perto e magoar, na maioria das vezes é preciso se expor e sentimos que não só Hannah, mas Lena Dunham faz isso, expõe com sinceridade e cuidado esses dramas e o que temos é um momento muito singular da dramaturgia na televisão. Fica o carinho  e esse delicioso reconhecimento com esse jeito errante de ir vivendo de Hannah e suas garotas.