No momento estou entre páginas abertas sobre a notícia, descrições curtas do que ele foi, do seu cinema, das suas contribuições, resumos de sua carreira, fiapos que fazem parte de um dia triste em que fazemos um pouco como ele, ficamos entre estilhaços, pedaços do tempo vivido que ele tanto perseguiu. Junto com tudo isso, uma página do word aberta, de um capítulo sobre a obra dele que estava escrevendo e que tinha me prometido terminar hoje.
Se pensarmos seu cinema, principalmente após "La jetée", culminando na outra obra-prima "Sans Soleil", o que temos é a perseguição de um tema que parece o da vida dele, esse de entender o que se dá sobre as pessoas, os lugares e as coisas com a passagem do tempo, o que é possível recuperar nessa passagem, e se recuperar não é possível, como reescrever, recriar?
É difícil não falar dele sem falar que, com sua ajuda, esse tema passou a ser também o da minha vida, as imagens irrecuperáveis do passado, o reencontro embassado ou poderoso com elas, o que fica, o que se perde, a convivência poderosa entre presença e ausência que constituem o trabalho da memória, tudo isso, todas essas marcas do passado no presente.
Seu cinema faz com que o dia de sua morte seja de meditação. Teria ele encontrado a imagem de alegria da sua infância? Teria o homem que viaja no tempo encontrado alguma paz na relação com suas imagens de alegria passadas? Chegar ao extremo da lembrança é encontrar a própria morte? Essas questões ele nos deixa. Hoje não é dia de dizer muito, é dia de pensar sobre ele, sobre os instantes que nos acompanham, sobre as imagens do seu cinema que nos ajudaram a pensar essas relações e sobre as outras história da vida que podemos reescrever nesse trabalho incessante que é o da memória, ela que talvez seja a nossa única chance de imortalidade.
2 comentários:
tainah, como é bom te ler. eu que, agorinha, estava escrevendo um texto sobre mulheres antigas que renomeiam as coisas do mundo quando todos vão gastando a memória, parei em teu escrito sobre marker e sobre o tempo vivido... que lindo e melancólico e doído!
Luciana, fico feliz de verdade que o texto tenha te comovido. Escrevemos pra guardar e pra encontrar. Obrigada por sempre passar por aqui e pelo carinho!
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