@ tainah negreiros

quarta-feira, 17 de setembro de 2014

Planeta Vênus






Muito já se falou sobre o cinema de Catherine Breillat ser dedicado à sexualidade feminina. Não sou exatamente uma conhecedora de sua obra para falar dela por inteiro mas está claro, em "Para minha irmã" e "Sex is Comedy", que o desejo das mulheres é questão. Aspecto que, de início, já revela um elemento interessante de subversão. O desejo feminino ( e a falta dele) é esmiuçado em suas possibilidades prazerosas e doloridas. Em "Para minha irmã", temos a sexualidade da mulher que também é desejada, a irmã mais velha Elena; e da jovem Anais, gorda, à sombra da irmã, entre gestos e outros de juventude e solidão, como na magnífica cena da jovem na piscina encenando sozinha dois encontros de amor enquanto beija a barra de ferro na piscina.
O filme vai da falta de escolha de Anais em partilhar as descobertas sexuais da irmã, da dor que isso lhe provoca, até seu delírio por uma experiência radical semelhante. Só "delírio" pode definir a sequência final do filme. Seu tom de sonho e de desejo profundo revela um elemento discutível da obra de Breillat sobre sua compreensão do desejo feminino, ao mesmo tempo que nos lembramos que o desejo feminino é mais de um  e pode ser, muitas vezes, sombrio.
O que se revela discutível e um discurso perigoso sobre o desejo feminino em "Para minha irmã" me parece muito bem resolvido em "Sex is Comedy". No filme de 2002, a diretora Jeanne está às voltas com sua equipe para filmar uma cena de sexo em referência clara ao filme anterior. Nesse caminho, está em questão o lugar de mulheres e homens no set e, acima de tudo, o modo como a diretora lida com seus próprios desejos e expectativas. Encenar, reencenar, decidir por um pênis ereto de plástico,  lidar com o ator irresistível e que vê no desejo uma disputa de poder, buscar a linguagem do corpo a despeito (ou em resposta) ao não dizer de algumas palavras. Em todo esse percurso, das coisas mais interessantes sobre o filme é a expressão do desejo dela como criadora e como mulher, como ele se manifesta no filme, nos seus interesses, na sua busca por um beijo juvenil demorado, ou no seu olhar que acompanha os passos de seu ator. Sua relação com os corpos e com o que eles dizem tornam o cinema única e apaixonada possibilidade para Jeanne/Breillat.
São tanto detalhes adoráveis em "Sex is Comedy", desde a relação ambígua com seus assistente, que Jeanne faz questão de descortinar, desde a atração/repulsão dela pelo personagem de Grégoire Colin, até finalmente seu olhar sobre as mulheres, da conexão que estabelece e de uma espécie de solidariedade com a mulher e suas experiências na vida e em cena. Algo que leva até a arrebatadora cena final do acalanto. É quase como se na cena final Jeanne dissesse para sua atriz, após finalmente conseguir a cena que imaginou: "eu sei, eu sei como é ser isso."

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