@ tainah negreiros

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

O Fotógrafo

Difícil fotografar o silêncio.
Entretanto tentei. Eu conto:
Madrugada minha aldeia estava morta
Não se ouvia um barulho, ninguém passava entre as casas.
Eu estava saindo de uma festa. Eram quase quatro da manhã.
Ia o Silêncio pela rua carregando um bêbado.
Preparei minha máquina.
O Silêncio era um carregador?
Estava carregando o bêbado.
Fotografei esse carregador
Tive outras visões naquela madrugada.
Preparei minha máquina de novo.
Tinha um perfume de jasmim no beiral de um sobrado.
Fotografei o perfume.
Vi uma lesma pregada na existência mais do que na pedra.
Fotografei a existência dela.
Vi ainda um azul-perdão no olho de um mendigo.
Fotografei o perdão.
Pilhei uma paisagem velha a desabar sobre uma paisagem.
Fotografei o sobre.
Foi difícil fotografar o sobre.
Por fim eu enxerguei a nuvem de calça.
Representou para mim que ela andava na aldeia
De braços com Maiakovski – seu criador.
Fotografei a nuvem de calça e o poeta.
Nenhum outro poeta no mundo faria uma roupa mais
Justa para cobrir a sua noiva.
A foto saiu legal.

(Manoel de Barros)

Um comentário:

Bruno Silva disse...

realmente muito lindo texto..
estarei sempre por aqui..
www.bsproducao.blogspot.com